terça-feira, 24 de agosto de 2010

Amiguense de Parkour



Durante a elaboração desse encontro nos fomos questionados: “Porque um nome tão feio e com erro de português?” e ouvi ainda conselhos do tipo “Com um nome melhor vocês conseguem mais patrocínios.”. A explicação:

Em 2008 aconteceu a primeira edição. Nessa época eu fazia mais treinos fora do estado do que aqui em Sergipe. As pessoas que tinham começado a treinar comigo subitamente encontraram coisas mais importante pra fazer; e os até então “atuais” não levavam os treinos a sério e só apareciam de vez em nunca. Não havia comprometimento e por isso eu viajava quase todos os finais de semana.

Por esse motivo, não me lembro se o Edi ou o Bata, teve a brilhante idéia: “Você viaja tanto pra treinar nos nossos picos, agora é nossa vez de ir todo mundo treinar nos seus. Se vire!”. Me desesperei quando esses idiotas convidaram gente de 3 estados pra vir pra vir pra Aracaju.

Eu era sozinho, não tinha estrutura e não fazia idéia de como me organizar. Mas a vontade de ter essas pessoas por perto e na minha cidade era superior ao medo de dar tudo errado. Corri que nem um doido e arrumei uma casinha pra alugar que serviu de abrigo pra todo mundo (no café, pão com mortadela... e no almoço, pão com mortadela). HUAUHHUAHUAAHUHUHUA!

O encontro foi inesquecível, mas até o último dia ele não tinha um nome (encontro é apenas uma desculpa para rever os amigos). Numa das muitas conversas eu soltei: “Isso aqui tá mais pra um encontro amiguense”. O nome pegou e no ano seguinte eu já escutava a cobrança de pessoas que nem tinham vindo pro primeiro: “Quando terá de novo um Amiguense de Duddu?”.

Dois anos se passaram. As pessoas amadureceram, o Parkour Aracaju e o evento também. Na terceira edição que aconteceu no último final de semana, disponibilizamos:

- Alojamento com colchões, banheiro e ar condicionado para todos os participantes (inclusive os de Aracaju);
- Almoços e camisas gratuitas;
- Água acessível nos alojamentos e treinos;
- Ônibus fretado para transporte dos tracers pro treino de madrugada;
- Autorizações para treinos em todos os picos que precisamos;
- E fomos buscar pessoalmente cada um na rodoviária.

E tudo isso apenas pelo prazer de receber elas em nossa casa. Desde antes da organização do evento dissemos: “Só se preocupem com o dinheiro da passagem e com as demais alimentações.”. O resto, a gente banca.

Sergipe é o menor estado do Brasil e ainda assim conseguimos com nossa iniciativa trazer 35 pessoas de fora pra treinar e conviver. Estatisticamente isso é muito!

O Amiguense não é um encontro exclusivo da panela. É um encontro que tem como objetivo tratar todos os participantes como amigos e deixar bem claro: “Venha! A gente faz questão de ter você aqui com a gente!”. E isso não é da boca pra fora. Dos 35 visitantes eu já conhecia 30. São amigos encontrando amigos e fazendo novos amigos. E é claro que isso regado a treinos de Parkour até o seu corpo dizer que não agüenta mais (que foi justamente o que aconteceu com a maioria).

Depois de tudo isso eu não posso acabar a postagem sem tocar na ferida de muitos:

Não gosto de gringos-showman porque isso claramente desvia o foco dos treinos para a “estrela” e serve como catalizador de moda-cabeça-de-bosta pro evento.

Não gosto de mídia porque ela torna o ambiente tenso e inibe a espontaneidade dos participantes. Quando é utilizada com bom senso ela é uma mão na roda e ajuda a melhorar a condição do Parkour na cidade e no Brasil. Mas não é isso que normalmente vemos acontecer.

Não gosto de cobrar taxas porque isso claramente limita a chance de mais pessoas vir ao evento. Treino com pessoas maravilhosas e que não tem dinheiro nem pra pagar o ônibus pra sair de casa pra treinar, imagine o que falar de um amigo que mora em outra cidade e que já tem que se preocupar com a saída de seu estado.

Um bom encontro de Parkour, pra mim, reside na felicidade e na descontração durante todo o evento. É você abrir as portas e um sorriso para que todas as pessoas, sem restrição de poder aquisitivo, naturalidade ou qualquer outro meio de segregação, possa participar e doar um pouco de si ao evento.

Diferente do que muitos argumentam, é possível sim fazer um encontro de qualidade, bem organizado e com objetivo único e exclusivo de reunir praticantes, treinar pra caralho, ser feliz pra caralho e com tudo isso acontecendo gratuitamente.

Acabamos de provar isso (novamente) no último final de semana. E olha que o patrocínio que arrecadamos (batendo de porta em porta e recebendo vários “nãos”) não seria suficiente pra pagar nem a ida de um gringo até o aeroporto.

Como já dito milhões de vezes nesse blog, essa é apenas a minha opinião. Não sou "o" certo. Não sou contra o que fazem os organizadores de eventos de Parkour (até porque a grande maioria eu conheço e são grandes amigos). E muito menos estou dizendo que me recuso a ir a eventos que não se enquadrem em meus termos.

Se prestar atenção lá em cima eu disse que “não gosto”. Apenas isso.

Muitas vezes prefiro ir pro encontro Pirapozinho de Parkour anunciado no blogspot dos meninos, do que pro Brazilian-Senegal International Parkour Meeting. Não diminuindo o mérito de um em função do outro, mas afirmando claramente onde eu me sentiria melhor adaptado.

Enquanto puder, eu vou continuar fazendo meu 110% pelos encontros que realizar, pelo Parkour e pelos tracers. E estou muito feliz em ver que existem pessoas dispostas a fazer o mesmo.


Obrigado a todos por mais um Amiguense inesquecível!

sábado, 14 de agosto de 2010

Não coma do chão!



QIOUPWIUPUEIUQIWIPOQIUPOWIPQIWUIQUIOWYQIUYWUQYUWIIUOQW Foi mau aí, mas é que não tem como começar essa postagem sem dar uma boa risada!

Bicho... é que eu escuto esse tipo de frase todos os treinos! “Não coma do chão!”, “Não pegue isso!”, “Largue de ser nojento!”, “Parece uma criança!”. E o pior é que quem fala tem talvez um pingo de razão!

Dando um mergulho no passado a gente encontra um duddu miniatura, já com óculos de garrafa, estatura semi-franzina e serelepe como toda criança em seus 6 anos de idade. Reza a lenda (e a capacidade de memorização das mães é incrível!) que nessa idade era um tormento sair na rua comigo. Como a quantidade de doces que eu ingeria era rigorosamente controlada, meus pais não podiam bobear porque qualquer bolinha de cor diferente que eu visse no chão já ia pra boca. Vocês dariam risada se escutassem minha mãe dizer que eu descolava chicletes pisados no meio fio e depois os mastigava esbanjando felicidade. Muitas vezes dava até pra ouvir os “crec!” do meu dente mastigando aquela borracha cheia de areia.

Eu cresci, né? E com noções básicas de higiene, cinturãozadas dos pais e a pressão social (a mesma que inibe a movimentação livre das crianças) o velho hábito de comer coisas estranhas desapareceu.

E demoraram 14 anos para que o Parkour fizesse acordar aquele ser "nojento" reprimido...

Calma! Calma! Não estou falando que peguei o hábito de mascar chiclete com terra! Mas sim do fato do Parkour ter me reeducado a ouvir o que eu quero fazer e aprender a ignorar o que querem que eu faça. Essa é uma ferramenta poderosa e que só deve ser colocada em prática quando se têm bom senso pra discernir até que ponto você não prejudica as pessoas a sua volta.

O Parkour transforma a forma como você enxerga o mundo. E por mundo não estou falando da arquitetura das construções ou do senso de proteção à natureza. Estou falando da redefinição de valores. A reforma íntima que cada praticante sofre. O novo guia de “como devo viver em comunidade” e o novo grau de tolerância às diferenças.

Muitas vezes minha situação no final de um treino é deplorável. Cara suja, roupa suja, mãos pretas e abertas de calo, calça rasgada na bunda e uma camelback fudida e nojenta nas costas (isso pra não falar do fedor!). É o quadro perfeito de uma criatura pronta para ser marginalizada. Mas será que preciso dar tanta atenção ao que irão pensar de mim?

Em dias de chuva eu entro em ônibus lotados e ainda assim existem cadeiras vazias porque uma janela aberta deixou a chuva molhar os acentos. Quando isso acontece meu sorriso se estende de orelha a outra. Todos ignoram o molhado, eu vou como um míssel em direção a ele. Afinal, aquilo é somente água e não ácido.

E quando o biscoito que acabei de tirar do pacote cai no chão? Se ele não tiver caído em merda de cachorro ou em escarro de bêbado... Eu vou comer! “Ai que vergonha!”. Porque? Vergonha é desperdiçar comida quando tantas pessoas (e eu mesmo) estão com fome.

Em praças de alimentação é que eu faço a festa! O cara compra um lanche CARÍSSIMO porque os amigos todos fizeram o mesmo, e então não agüenta comer a metade. Ele se levanta e deixa pra trás aquele punhado de batata frita que irá diretamente para o lixo! Pelo meu kong precisão!!! O que me impede de sair do lugar e retirar gentilmente as batatinhas antes que a servente chegue primeiro? Não é nojento. É econômico! Mata a fome e diminui o desperdício. Não causei mal a ninguém e nem irei pegar uma doença terminal. Então porque não o fazer? Porque as pessoas ao meu lado irão notar? Porque pode ter um amigo meu de faculdade secretamente me observando? Eles que vão cuidar de sua própria vida!

O Parkour trabalha esse lado mais ogro e “irracional” do ser humano. Estou acostumado a ver sangue na minha canela, lidar com cascas de ferida, com pús nos calos, lama, lodo, bosta humana nos picos e por isso não tenho tempo e nem saco pra frescuras.

Quem me viu nos últimos 6 meses deve ter reparado que meu óculos está remendado no meio. Ele abriu em dois pedaços quando eu calculei um cat errado e bati a cara numa árvore. Mas seria justo comigo mesmo (e com meu bolso) gastar 500 reais em um óculos novinho sendo que esse ainda me serve? Bastou uns toques de Magyver do meu pai e voilá! Tô enxergando de novo! Aqui no trampo essa semana até começou uma campanha “vamos dar um óculos novo pro duddu”. OIUWUQIUWIPOQIOPWUIPOUQIUIWOIQOP

“Oi mosquinha você ficou grudada no meu pudim? Caiu no meu pão? Não tem problema! Eu retiro o pedaço que você tocou e como o resto.”

“Moço não vai querer mais a coca-cola de 600 ml? Eu tomo o resto pelo senhor pra que não se desperdice. Já economizo o dinheiro do meu próximo lanche.”

“Não tem copo? Olha... tem um descartável ali no chão... vamos dar uma lavada nele que ele fica novinho!”

A cada dia tenho mais raiva de quem tenta me obrigar a manter a etiqueta e as aparências.

E olha que eu sou limpo, viu? Vocês precisam escutar as estórias do Pop bebendo água empoçada da chuva como se fosse um cachorro na sarjeta... mas essa fica pra um outro dia. ;)