segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A Criança Interior


As coisas que acontecerem nas últimas semanas parece que foram premeditadas para me obrigar a fazer essa postagem. Eu sou um cara bobão, com espírito criança... porém todo esse ar infantil não modifica a minha realidade em que vivo: um mundo que é, por sua natureza, adulto. Não tenho contato diário com crianças e, muitas vezes, passo um bom tempo sem conversar com uma.

Durante a virada esportiva, eu tive a oportunidade de orientar muitos iniciantes, mas nenhum deles me deu tanto prazer como a tropinha de seus 11 anos que, subitamente, parecia ter brotado ao meu lado. Eles são os parceiros de treino perfeitos! Topam de tudo, conversam com naturalidade, não sentem pudor ao toque, treinam porque se sentem bem e fazem questão de que cada momento empregado no treino seja em prol de seu próprio objetivo (diversão).

Nesse dia em específico, eu lembro que por diversos momentos os papéis se inverteram: eles é que me instruíam e mostravam o que eu devia fazer pra me divertir como eles. Cheguei várias vezes a entregar a liderança do percurso para eles só pra ver o grau de macacadas que iriam aprontar! Huaahuahuahu! E foi muito legal! Tive que me arrastar no chão, galopar os corrimãos mais baixos e não saltar os maiores (porque obviamente eles não alcançavam) e tomar rotas que eu provavelmente não escolheria. O meu “guia” de tempos em tempos olhava pra trás com aquela cara de “deixa eu ter certeza que ele está me seguindo mesmo afinal ele é um adulto...”, e eu até agora lembro da cara de espanto dele ao constatar que “é... ele ta mesmo fazendo tudo que eu faço...”.

O tempo passou e aquela lembrança voltou comigo pra Aracaju. Os treinos por aqui estavam da mesma forma: pouco motivados, sem caras novas e com as pessoas infelizmente só se dedicando ao Parkour de final de semana. A realidade daqui, inclusive, não contribuiu muito para que a campanha do “One Giant Leap” em Aracaju fosse tão boa como poderia ser, mas eis que o evento produziu um fruto único: crianças.

Elas, que estavam no parque passeando com os pais, se misturaram aos poucos iniciantes daquele dia e me obrigaram a largar o treino avançado para me dedicar as suas traquinagens. O local era um tanto perigoso para treinarem (uma árvore única que alcança uns 5 metros de altura) então por isso eu me desloquei com o grupinho para uma área mais neutra. O “tio”, que constantemente era dito pra mim, me deixava muito feliz e me fez sentir novamente aquela sensação da virada esportiva. Conversei com elas e após ver que eu estava lidando com novos praticantes em potencial, tomei a decisão de trazer os treinos de iniciantes do GT para Aracaju. Estamos partindo para a quarta semana com um treino semanal, e embora eles sejam poucos e nosso tempo a principio curto, é o suficiente pra nos divertirmos juntos e aprendermos uns com os outros.

Vou aproveitar o espaço e o tema e registrar dois acontecimentos que ocorreram durante os treinos do GT por aqui e que eu quero me lembrar sempre e sempre.

Léo é um menino de 12 anos, classe média-alta e super-protegido pelos pais. Ele me adicionou no msn do nada e colocou na cabeça que queria treinar parkour. Fiz um tratamento de choque dizendo que ele seria mais um que quando visse o quanto parkour é difícil iria largar de imediato. Engano brutal. Esse menino têm demonstrado uma vontade de aprendizado incrível e têm me ajudado muito no meu próprio entendimento de “o que quero com o parkour e como atingirei meus objetivos”.

Quando cheguei ao primeiro treino de iniciantes, o Léo e um amigo dele estavam pulando de um local um tanto alto e caindo com toda força no chão. De imediato tomei uma decisão: todos os treinos de iniciantes seriam descalços.

Mas não pense que foi fácil... saca só a conversa após o alongamento:

- Bom pessoal, vamos começar. Mas antes queria pedir que vocês tirassem o tênis.
- Porquê?
- Porque treinar descalço vai te ajudar a conhecer melhor seu corpo e a não confiar no excesso de segurança que o tênis te dá.
- Mas se eu tirar o tênis meu pé vai começar a doer e eu não vou conseguir fazer nada.
- Léo, eu te garanto que você vai treinar numa boa e que essa dor será mais um motivo para você aprender a se movimentar sem fazer algo que machuque seu pé.
- Mas você disse que ia treinar com a gente também e que não ia ficar só falando.
- Ué, mas alguém disse que eu não vou?
- Mas você vai treinar sem tênis também?
- Exatamente.


Eu sentei no chão e tirei o meu. Após ele ver que eu estava me igualando a ele, ele se sentou e retirou o dele. Achei muito interessante esse raciocínio e o questionamento. Me fez perceber que se naquele momento eu frustrasse a expectativa dele, as recomendações que fiz ao longo do treino não teriam sido tão bem absorvidas. Nos treinos vou sempre fazer o meu máximo pra me igualar. Antes de ser visto como “o instrutor” eu prefiro ser visto como “o colega”. Estar ali no meio, sofrendo em conjunto e compartilhando o mesmo trabalho é fundamental nesse processo de aprendizado em duas vias.

No mesmo dia, após já termos treinado pra caramba, o Léo saiu com mais dois meninos para pedir água numa lanchonete. Quando fui atrás deles me deparei com o Léo atirando um copo descartável no chão e vindo ao meu encontro. Deu-se o outro diálogo:

- Cara, eu só saio daqui quando você voltar lá, pegar o seu copo e jogar no lixo.
- E porque eu tenho que fazer isso?
- Porque a praça não deve ser culpada pela sujeira que você criou. Quando a gente chegou aqui ela tava limpa.
- Todo mundo joga lixo na rua.
- Mas a gente não vai jogar. Vamos fazer assim, todo lixo que a gente tocar a gente fica sendo responsável por ele e tem que dar um fim.
- Então porque você não jogou no lixo aquele pedaçinho de papel que você pegou no chão no começo do treino?


Eu senti o chão sumir dos pés. Antes do aquecimento, eu tinha pegado no chão um papelzinho de uns três centímetros, li o que estava escrito e devolvi pro mesmo lugar. E agora? Como inspirar "o correto” se eu não fiz o correto? A única coisa que me veio a cabeça foi:

- É mesmo. Você tem razão.

Dei meia volta peguei o papel e joguei no mesmo lixo que ele já estava colocando o copo descartável.

Analisando a situação mais tarde, vi que essa foi a melhor postura que eu poderia ter tomado. Apesar de ser mais velho e mais experiente, eu não posso pensar em ser superior a eles, pois na maioria do tempo eles estão vidrados em tudo que eu faço. E se eu for irredutível ou tentar mascarar os deslizes que cometer... como diabos terei autoridade suficiente para cobrar?

O rosto do Léo ao ver que “tinha me pego” era bem do tipo “olha, ele também erra” e melhor ainda, era “olha, eu posso falar porque ele ouve o que eu falo”.

Eu vou tentar manter o máximo possível essa postura flexível. Claro que o controle da situação deve ser mantido, e as vezes precisarei ser rígido, mas tô aprendendo aos poucos que não preciso ser rude e fingir que sou perfeito para ser respeitado ou inspirar alguém.

Tomara que o Léo nunca leia essa postagem, se não ele vai ficar se achando o rei da cocada preta! HUAHUAHUAHUHUAHUAHUAHUHUAHUUHHAHUHUAHUAHUA!

Ah... e meu sobrinho nasceu!
Gabriel, aprenda logo a engatinhar para que o tio possa te ensinar a subir uns muros!

13 comentários:

Lucas Santana disse...

Caraca o-o

Esse Léo tem sempre as perguntas certas. o-o

E parabéns pelo nascimento do sobrinho! o/

Humberto disse...

Aah, eu já tinha dito ao Memórias que vocÊ era pedófilo e que essa história de Disney era só pra chamar atenção! Tô rezando pra meu irmão aprender a andar também, pra eu botar ele no físico :> e que monstrinho você tá cuidando em Duddu? Leo, venha em maceió pls!

Felipe disse...

é...

vc era a maior criança da virada.
xD

Rafael Santiago disse...

muito show esse post...
parabéns pelo sobrinho... espero que ele vire um traceur dedicado como vc... o mesmo desejo ao Léo...

C.R. disse...

Hehehe, criança sempre anima um treino, este fds eu fui fazer uma apresentação pro EPTV (GLOBO local), como era dia das crianças domingo o EPTV organizou uma coisa pra elas numa cidade próxima, cheio de coisa, corte de cabelo gratuito, piscina de bolinha e etc, e teve parkour tbm :D
EU fiquei mais na parte de instruir (confesso que gosto) e lá tinha um garoto Duddu que meldels, não só a movimentação, mas o raciocínio dele era muito avançado, ele tinha uns oito anos... Pena q é de classe bembaixa e mora em piracicaba e não na minha cidade, ele me levou no pai dele e o pai dele pego mel celular, daí falei pra levar ele pra Limeira de fds que a gente treina, é triste saber que nunca vai acontecer :(

Pedro disse...

Seu pedofilo. Não faça tributos ao Michael Jackson só porque ele morreu, ou para ganhar um lugar na DisneyWorld que nem ele.

Brincadeira.

Eu odeio crianças. Mas as lá do ginasio são muito sagazes. Bem só 4 delas na verdade, o resto é só moleque chato e fresco.

Mas, what ever rocks your boat man, seja feliz. Mas não va engravidar alguem ai se quiser procurar um discipulo ou um Duduzinho, IMAGINA UMA CRIANÇA COM ORELHAS TÂO GRANDES!

Ian Ludgero disse...

Eu concordo com todas as virgulas! Me deparei uma vez com a seguinte situação:

Chegamos na casa de um amigo nosso que tinha perdido a chave do portão e não tinha ninguem em casa, o muro da casa dele era muito alto mas tinha uma arvoré do lado do muro, eu logo disse:
- A gente sobe pela árvore e passa pro muro.

PASME! NINGUEM CONSEGUIU SUBIR.

Eu logo perguntei, porra, ninguem subia em árvore quando era moleque?! A resposta foi unica:"Fui criado em condominio".

Eu fui criado na rua, e ainda bem que eu não deixei morrer tudo o que eu aprendi quando era menor, inclusive subir em árvore!

Anônimo disse...

Duddu!!!! Bem cara eu ja imaginava que vc nun fosse acostumado a ter dialogos com crianças... Mas não no ponto que vc falou cara asuhdauhsd. Olha fico muito feliz por vc cra e parabens pela linda postagem, vi que para faze-la vc aprendeu muito cara.
Parabens mesmo e te digo mais, vc ainda tem muito a aprender com essa pivetada uhsdhuad ja tbm tive o enorme prazer de ajudalos e eram ate mais novos na faixa dos 7 aos 11 cara!

Abração brother td bom pra vc!

Anônimo disse...

Realmente intereçante esse ponto de se igualar com quem treina com vc ou quem vc esta treinando, eu normalmente sou muito "bruto" com pessoas que estao começando, mas vc me fez abrir os olhos. curti muito o seu blog.
abraços de brasilia. =D

Leonard Akira disse...

Oi Duddu


Muito boa a postagem, já passei por umas situações parecidas e realmente é gratificante aprender com os mais novos, e poxa to admirado com este Léo, pelo jeito veremos ele de novo nas postagens neh ? rs

Parabens pelo Sobrinho ! :)

Bons treinos

Hiram disse...

Caraaca,
que fooda veio *-*
voce so me fez lembrar aqui do treino do sabado passado que chegaram dois irmaos de cabelo liso,
um deveria ter uuns 9,8 anos e o outro uns 7, 6 por ai.
ai ele chegou pra min e disse,
mano, quero fazer le parkour, mais não é limpacu nao viu?
me mijei de rir, e comecei a passar umas coisinhas pra eles, caramba aqueles meninos sao fodas *-*
um ate dançou break laa ayeAUHEUaheU

Caires disse...

valeu pelo post duddu

Ettore disse...

Quase chorei aqui(é sério!). Foda demais.
Abras
[fiz uma conta lixo aqui só pra poder comentar]